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Saúde

'Diziam que era dor de mulher': a demora no diagnóstico de endometriose que leva à menopausa cirúrgica

Desconhecimento sobre doença e falhas médicas podem fazer com que pacientes convivam por anos com crises graves. Em alguns casos, isso culmina na retirada dos ovários, o que leva aos sintomas típicos que mulheres enfrentam quando param de menstruar.

24 JUL 2022Por Redação/TR18h:11

Aos 32 anos, a artesã Adriana Tigre começou a ter sintomas típicos das mulheres que chegam à menopausa. Episódios de calor intenso, irritabilidade, alterações no sono e no humor…

Normalmente relacionados ao período que engloba o último ciclo menstrual das mulheres, entre os 45 e 55 anos, os sinais apareceram mais cedo na vida da paulistana, hoje com 37, por causa da retirada dos ovários — uma antecipação conhecida como "menopausa cirúrgica".

Endometriose acomete uma em cada 10 mulheres no Brasil, mas diagnóstico pode levar até 10 anos; entenda

O procedimento, que pode trazer riscos à vida da mulher, deve ser evitado. É indicado em casos específicos, alerta a ginecologista Ceres Resende, coordenadora da área de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (UnB) (leia mais abaixo).

Sofrendo com "dores incapacitantes e insuportáveis" desde a primeira menstruação, aos 12 anos, Adriana passou pelo procedimento após ser diagnosticada tardiamente com um quadro grave de uma doença que afeta uma a cada dez brasileiras, segundo o Ministério da Saúde: a endometriose.

O problema ocorre quando um tecido semelhante ao revestimento do útero cresce em outras partes do corpo — geralmente, ao redor dos órgãos reprodutivos, intestino e bexiga. Não há causa conhecida ou cura.

Recentemente, a cantora Anitta compartilhou conviver com a doença, o que levou a uma disparada na busca e nas postagens sobre assunto na internet e nas redes sociais brasileiras.

Dor normal?

Desde adolescente, Adriana relata que ouvia de familiares, amigas e médicos que o que ela sentia durante a menstruação era uma "dor normal, de toda mulher".

"Eu me questionava se a dor era tão forte assim, me sentia uma mulher fraca por não aguentar aquela dor, já que as outras aguentavam. Mas a verdade é que não era normal. Eu só melhorava, em algumas crises, quando tomava morfina", descreve.

A artesã conta que precisou ir diversas vezes ao hospital com dores em que "pedia para morrer" e passou por dezenas de médicos que "minimizavam" seu sofrimento. Foi só depois de entrar para um grupo de mulheres do Facebook que ela viu uma possibilidade de diagnóstico para entender o que ela sentia.

"Eu nunca tinha ouvido falar que endometriose existia."

Uma ultrassonografia transvaginal confirmou a suspeita. "Quando descobri, já estava no estágio 4, que é a severa. Tinha atingido a bexiga, o intestino, invadido camadas de músculo", conta. A média de atraso para descoberta de endometriose é de oito anos, segundo a médica Ceres Resende.

Adriana precisou passar por uma laparoscopia, procedimento cirúrgico para a retirada de focos da endometriose e, em casos muito graves, dos ovários.

'Médicos normalizam a cólica 'A produtora e designer Ana Fontelle, 53 anos, do Rio de Janeiro, viveu uma situação parecida. Ela conta que, desde os 12 anos com dores no período menstrual e com episódios graves de sangramentos, ela ouvia que precisava "aguentar" sua condição feminina.

"Muitos médicos normalizam a cólica, passam remédios fortes e dizem que é isso. Fui levada a acreditar que era algo normal."

Quando ela perdeu o movimento da perna esquerda e teve um inchaço grande na barriga, em 2015, uma investigação médica levou à descoberta da endometriose. Inicialmente, fez tratamento para o nervo ciático, com acunpuntura e idas ao ortopedista.

"Uma médica, que digo que foi minha salvadora, descobriu que a endometriose já tinha se espalhado para outros órgãos, como intestino, afetando até os nervos", diz.

Em uma cirurgia de sete horas, Ana perdeu dez centímetros do intestino grosso e teve que remover apêndice, útero e também os ovários.

Aos 47 anos, ela entrou em menopausa cirúrgica. Apesar da idade, não tinha os sintomas do climatério, que é o período que antecede e sucede a menopausa natural.

Só em casos extremos

Apesar de casos relacionados à endometriose, a maioria das pacientes que precisam retirar os ovários e entram em menopausa cirúrgica o fazem por outros motivos, explica Ceres Resende, da UnB.

Os principais são os cânceres de ovário e de endométrio, tumores benignos que ocupam todo o órgão, ou ainda pacientes que se submetem ao procedimento porque foi identificado por um profissional que têm alto risco de desenvolver câncer (identificado com exames genéticos, como o caso da atriz Angelina Jolie).

Nos casos de endometriose, o ideal é que não se precise chegar ao ponto da ooforectomia bilateral (a retirada dos dois ovários), diz Resende.

"É muito triste ver que, ainda hoje, tem-se a ideia de risco de perder ovário por causa de endometriose. Sempre tem que tentar preservar o tecido ovariano dentro do possível."

"O ideal é ter diagnóstico antes, instituir tratamento, principalmente um bloqueio menstrual, com acompanhamento clínico. Se for fazer tratamento cirúrgico, pode fazer em mais de uma abordagem, não precisa retirar toda a endometriose. Pode retirar uma parte para tentar preservar os ovários, esperar e fazer uma segunda etapa", explica.

A médica ressalta, porém, que, em casos extremos, esse pode ser um caminho: "Por exemplo, se você tiver que aliviar uma dor que incapacita a vida dessa mulher".

BBC/g1

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