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Os primeiros efeitos da crise na UFMS: ar condicionado racionado, corte nas bolsas e reagente pago pelo pesquisador

10 SET 2019Por Redação09h:12

Por volta de 10 horas o calor já atingia os 35 graus em Campo Grande na segunda-feira (9). É detalhe que faz toda a diferença, agora, na rotina de quem passa o dia no campus da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), onde em algumas salas de aula e até na biblioteca há horário certo para ligar o ar condicionado.

A tese das manhãs mais frescas não funciona, na prática, no “veranico” quente e seco que atinge a Capital de Mato Grosso do Sul: fica difícil aguentar a restrição do uso do ar. É apenas um detalhe do panorama de corte de gastos de R$ 29 milhões diretamente do Ministério da Educação (MEC), além dos R$ 51 milhões bloqueados de emendas parlamentares.

São R$ 80 milhões a menos para a Universidade, 52% dos recursos discricionários, o que representa o segundo maior corte entre as instituições de todo o país, conforme apontou reportagem da Folha de S. Paulo.

Os cortes do governo Bolsonaro atingiram 63 universidades e 38 institutos federais do país

Horário para ligar e desligar as luzes e o ar condicionado são, ainda, indícios leves do impacto dos cortes da Educação, mas já colocam o aparente clima de normalidade em alerta. O futuro da pesquisa também permanece incerto com o corte nas bolsas de pesquisas – da graduação ao pós-doutorado.

Mato Grosso do Sul é mais atingido do Centro-Oeste e o 10º entre todos os Estados, de acordo com o levantamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Por aqui serão atingidos 107 bolsistas, redução de R$ 714.800,00 nos últimos quatro meses de 2019.

Além da Capes, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), outra agência federal de financiamento de pesquisadores, informou que vai suspender o processo de seleção de bolsistas no Brasil e no exterior, por falta de recursos. O cálculo é um déficit de R$ 330 milhões no orçamento.

Plano de saúde reduziu

Até a seguridade dos servidores está em risco. Desde o dia 1 de setembro está suspensa, por tempo indeterminado, adesão de novos titulares ao plano de saúde da UFMS, o Programa de Assistência à Saúde (PAS), que sofreu redução na abrangência dos serviços.

Agora, estão suspensas as autorizações para realizar internações eletivas, que são aquelas “não urgentes”, tratamentos de próteses e implantes dentários e autorizações dos tratamentos especializados como hidroterapia, Reeducação Postural Global (RPG) e Acupuntura.

O valor que o segurado tem que dar do próprio bolso para exames aumentou para 20% do valor total do exame e para as consultas de urgência e emergência aumentou para R$ 50.

Não vai ter mais ressarcimento, no PAS, dos procedimentos odontológicos de “Protocolo e Placa de Mordida ou Placa para Bruxismo” e os ressarcimentos de consultas de especialidades médicas ficam reduzidos a 80% do valor da consulta até R$ 250.

Estudante de Farmácia, Keterli Soares da Silva, 21, relata que agora é mais difícil ficar na biblioteca, já que o ar condicionado nem sempre está ligado

“Pediram para economizar no ar, e tem desligado mais as luzes. No banheiro sempre vejo as luzes desligadas agora. O banheiro do bloco da quadra desde o começo não tem papel higiênico”, conta outra caloura de Farmácia, Natasha Ledra.

Natasha e Keterli afirmam que além do custeio, a pesquisa de uma das professoras do curso, que ministra a disciplina de histologia, foi prejudicada. “Ela está analisando o tecido de um ratinho e não vai ter mais dinheiro para continuar financiando esse procedimento”, disse.

Estudante de Direito, Patrícia Estolano, 26, está no 5º semestre do curso e conta que as luzes nas salas, antes das aulas, são desligadas para economizar. “Fiquei um pouco perplexa [com anúncio de cortes da Educação], se você cerceia recursos você compromete o futuro da universidade. A pesquisa é um dos pilares”, comenta.

Não tem monitoria

No curso de psicologia, já não há monitores. Sem bolsa para essa atividade, não há quem se interesse em ajudar os alunos a reforçar o que é aprendido em sala de aula. Bruna Gardan, 19, está no primeiro ano do curso e afirma que o clima é de alerta. “Estão todos mais atentos [com desperdício], tendo mais cuidado”, diz.

Segundo a estudante, durante algumas aulas, o ar condicionado não pode ser ligado. “Fui nesse banheiro aqui ao lado e não encontrei papel”, complementou ela. A colega de sala, Evelin Fernandes, 21, emendou que as luzes, no banheiro em questão, estão sempre apagadas.

Uma das funcionárias da Secretaria da Faculdade de Artes, Letras e Comunicação (FAALC), Cristina Pavam disse que, até agora, o clima permanece “normal”, apesar da orientação para reduzir o custeio em energia elétrica e até papel. O maior impacto, conta, foi no plano de saúde.

Estudante de engenharia civil, Lucas Morais 21, informou que o curso segue com as atividades no mesmo ritmo, sem restrição ao uso de ar condicionado, por exemplo. Não é o que ocorre com outras graduações da UFMS.

“Tenho conhecimento de que alguns cursos, como fisioterapia, reduziu bastante o uso do ar, que está proibido em alguns horários”, disse.

Incerteza é, para Natália Koch, 34, a palavra do momento nos laboratórios de botânica. Ecóloga e bolsista de pós-doutorado no Programa de Pós Graduação em Botânica desde 2016, ela depende da bolsa que recebe para continuar estudando a importância dos liquens (associações simbióticas de mutualismo entre fungos, algas e cianobactérias) como indicadores de qualidade ambiental em Campo Grande.

A modalidade de bolsa que ela recebe, financiada pela Capes, é renovada todos os anos. “Não sei se de fato será renovada. Nosso curso é nota 3”, relatou, uma alusão aos cortes de bolsas para programas com notas 3 e 4.

“Nós perdemos 70% das bolsas de mestrado. O dia-a-dia se mantem normal, mas o problema é o futuro, isso será sentido só daqui um ou dois anos”, diz Natália. Segundo a pesquisadora, há colegas que pesquisam questões da biologia em certas áreas territoriais e o perímetro da área estudada teve que ser reduzido para que a pesquisa não morresse.

Sem dinheiro para reagentes

Além disso, reagentes para fazer análise molecular, que podem custar até R$ 1 mil, também estão saindo do bolso de quem pesquisa, a exemplo de Natália. “Para análise de DNA também, que é feito inclusive fora do Brasil. Se o reagente é usado para a pesquisa específica do aluno, ele é quem tem que pagar”.

“Eu acho que sim [vai piorar], mas torço para que não. No ano que vem o gasto com as bolsas vai diminuir pela metade. Se a minha bolsa não for renovada, o projeto para e eu volto para o Rio Grande do Sul”, concluiu.

Fonte: Campo Grande News - Izabela Sanchez

 
  • Natalia Koch não sabe se terá bolso de pós-doutorado em 2020 Foto: Marina Pacheco
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