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Do puxa-saco ao sadomasoquista: uma análise do Brasil

Marcia Tiburi é Filósofa

10 ABR 2018Por Redação/TR21h:33

Todos conhecem a popular figura do puxa-saco. A adular pessoas famosas, poderosas ou ricas, a bajular qualquer um que detenha poder, seja ele midiático, político ou econômico, o puxa-saco não passa de um chato, cujo comportamento servil incomoda quem não precisa dele, mas é a presença que conquista quem estabeleceu uma relação frágil com o poder que tem, ou imagina ter.

Infelizmente, o puxa-saco é mais do que isso. Ele é a personificação do sadomasoquista social. Se abaixa a cabeça para uns, exige subserviência de outros. Covardes digitais que encontram um lugar ao sol nas redes sociais são puxa-sacos na vida real. Ora Zé-Mané, ora VIP, ele se identifica com líderes autoritários e se realiza no prazer de maltratar verbal ou fisicamente pessoas de quem ele teria medo na vida real.

Denunciado em sua tática de adulação, todo puxa-saco parte para a ignorância tentando destruir quem percebeu seu jogo. Agentes sempre prontos a atuar nos regimes de exceção, eles gozam com a parte que lhes cabe, seja na corporação, seja no tribunal, em casa ou nas ruas.

O puxa-saco, quando não está na posição servil do masoquista, torna-se um sádico autoritário.  Lacaios célebres, capitães do mato e capos dos campos de extermínio tem com o puxa-saco um elemento em comum: o desejo de punição. O puxa-saco ama a autoridade a quem chama de doutor por usar gravata.  É dessa autoridade que imita o gesto punitivo. Como a autoridade, embora pudesse ser a própria vítima, ele persegue um objeto de fetiche: a mulher, o judeu, o indígena, o pobre ou mesmo o ex-presidente nordestino. Sadomasoquismo foi um termo primeiro usado para se falar de relações sexuais que eram consideradas perversas ou fora dos padrões aceitos na moral do século 19 europeu. Até hoje o termo sádico relaciona-se à ideia de alguém que sente prazer em fazer o outro sofrer enquanto o masoquista sente prazer em ser objeto do sofrimento causado por outro. No sadomasoquismo as duas posições psíquicas se confundem em um jogo curioso.

A sexualidade atravessa as relações. O sadomasoquismo é comum a elas, mas em um sentido expandido, que vai muito além das perversões históricas ligadas à práticas sexuais. Digamos que as práticas sadomasoquistas estereotipadas, pessoas vestindo roupas de couro e se chicoteando em altas orgias à luz de velas, é o que há de mais enfadonho na história do sadomasoquismo.

O fascismo é bem mais picante e comanda muito melhor a sexualidade ansiosa. Uma grande tara social mal resolvida talvez seja a sua mais perfeita definição. Não espanta que a classe média, aquela para quem Freud sempre prestou serviços como psiquiatra, adore os privilégios dos ricos e odeie os direitos dos pobres. A redução do sofrimento que faz parte da luta por “Direitos Humanos” interrompe o jogo sadomasoquista e por isso é insuportável.

 Meio de subjetivação, padrão introjetado, o sadomasoquismo está no amor submisso ao líder, nas práticas de humilhação das escolas, no discurso de ódio ou no desejo de punir comum à nossa época.

Ao Brasil, nesse momento, seria necessária muita psicanálise, algo que interrompesse o fluxo de gozo desse poder delirante.  A ideia de uma superioridade de classe é a narrativa compensatória nesse momento. Contudo, o sádico não fica em pé sem um masoquista e nessa falha resiste a esperança do momento sócio-político vivido atualmente.

Fonte: Jornal do Brasil

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